Sociologia do Conhecimento surge na primeira metade do século XX e, na condição de ramo da sociologia, procura teorizar e avaliar com a isenção e responsabilidade cultural comum aos sociólogos a respeito dos diversos campos do conhecimento, em facetas sociais que não podem escapar a um exame crítico competente.

Problema da Sociologia do Conhecimento

Mannheim, discorrendo acerca do problema de uma sociologia do conhecimento, reforça a popular constatação de que nada pode ser intelectualmente um problema se não tiver sido, antes, um problema da vida prática; cumpre, então, não apenas observar os problemas teóricos de um dado momento, mas levar em conta na mesma medida os problemas simultâneos da vida prática. Tal campo de visão, em resumo, constituirá para o sociólogo sua constelação de problemas a serem solucionados — termo inicialmente surgido na astrologia e adaptado para a disciplina sociológica.

Necessita-se, segundo o autor, não apenas catalogar as correntes de pensamento existentes e seus rumos, mas de que esta sociologia faça análise estrutural radical dos problemas de uma determinada época, sem deixar de levar em conta as tensões em que o cientista vive e como estas influenciam consciente ou inconscientemente seu pensamento (p. 16).
Ainda esforçando-se na problemática desta disciplina, traz à tona o fato de que, se em tempos idos, os indivíduos transcendiam o pensamento nas revelações religiosas, nos êxtases etc., agora a consciência foca-se na esfera histórica e social, tendo nela a primazia o fator econômico (p. 23).

Assinala enfim outros comentários razoáveis oriundos do olhar sociológico, como o fato de observadores inclinados à posição de pensamento de extrema esquerda ou extrema direita serem incapazes de pensar rotas históricas atravessadas por outros grupos, assumindo a posição implausível de conceber uma história das ideias sem a mais mínima intercomunicação de correntes diversas (p. 29).

Os pontos de vista filosófico-sistemáticos para a elaboração de uma sociologia do conhecimento que são considerados mais importantes por ele são:

Auguste Comte, formulador da doutrina positivista.
Auguste Comte, formulador da doutrina positivista.

a) positivismo — corrente surgida no século XIX, idealizada principalmente por Auguste Comte e John Stuart Mill, que afirma ser o conhecimento científico, comprovado através de métodos válidos, o único verdadeiro;

Immanuel Kant, formulador do apriorismo.
Immanuel Kant, formulador do apriorismo.

b) apriorismo formal — linha da pensamento que, sendo uma mediação entre racionalismo e empirismo, também considera a experiência e o pensamento como fontes de conhecimento, todavia também com elementos a priori, ou seja, independentes da experiência;

Edmund Husserl, fundador da fenomenologia.
Edmund Husserl, fundador da fenomenologia.

c) apriorismo material — ponto de vista que é associado à escola fenomenológica, que afirma a importância dos fenômenos da consciência humana e seu estudo;

Wilhelm Dilthey, conceituador do historicismo.
Wilhelm Dilthey, conceituador do historicismo.

d) historicismo — corrente que busca a historização de todo pensamento sobre os seres humanos, suas culturas e seus valores, ainda afirmando que o panorama do mundo humano, tal como se apresenta em determinado momento, é sempre produto de processos históricos de formação, que podem ser reconstruídos pelo pensamento humano e tornarem-se inteligíveis.

Breve exposição da Sociologia do Conhecimento de Robert K. Merton

Robert K. Merton, expositor da Sociologia do Conhecimento.
Robert K. Merton, expositor da Sociologia do Conhecimento.

Define inicialmente a palavra “conhecimento” relacionada a uma gama de produtos culturais, como ideias, ideologias, crenças jurídicas e éticas, filosofia, ciência, tecnologia etc. Faz lembrar os precursores da sociologia do conhecimento, como Ernest Gruenwald, seu primeiro historiador, e Whitehead, que mostra o espírito da disciplina ao constatar a diferença considerável entre se aproximar de uma teoria e captar-lhe a aplicação exata, pensamento que a história da ciência tem demonstrado (p. 81-82).

Paradigmas para a Sociologia do Conhecimento

Na primeira pergunta “Onde se situam as bases existenciais dos produtos mentais?“, coloca bases sociais, relativas à posição social, classe, geração, papel ocupacional, modo de produção, estruturas de grupo (universidade, burocracia, academias, seitas, partido político), situação histórica, estrutura de poder etc.

Também para esta pergunta são colocadas bases como valores: Ethos — termo que designa conjunto de traços e modos de comportamento que constituem o caráter ou identidade de uma pessoa ou coletividade[2] e que, no contexto sociológico, pode resumir-se como de síntese da identidade de um povo —, “clima de opinião”, Volksgeist — o espírito do povo, uma espécie de consciência popular que, segundo a Escola Histórica, seria anterior e superior ao Estado[3] —, Zeitgeist — termo que se refere ao clima intelectual e cultural de dada época, vem do alemão Zeit ‘tempo’ + Geist ‘espírito’[4] —, o tipo de cultura que, assim como valores, também é uma das constituintes etc.

A segunda pergunta que coloca é “Quais são os produtos mentais submetidos à análise sociológica?“, à qual sugere esferas de pensamento como crenças morais, ideologias, ideias, categorias de pensamento, filosofia e crenças religiosas, normas sociais etc., e aspectos analisados como sua seleção (focos de atenção), nível de abstração, pressupostos, conteúdos conceptuais etc.

A terceira pergunta do paradigma é “Como se acham os produtos mentais relacionados às bases existenciais?“, para a qual postula relações causais ou funcionais como determinação, causa, correspondência, condição necessária, interdependência funcional etc; relações simbólicas, expressivas ou orgânicas como consistência, harmonia, coerência, unidade, congruência, compatibilidade, expressão, percepção, expressão simbólica, identidades estruturais etc; termos ambíguos para designar as relações: correspondência, reflexos, ligados a, em estreita conexão com etc.

A quarta pergunta: “Por quê? Funções latentes e manifestas atribuídas a estes produtos mentais existencialmente condicionados“, à qual nomeia como atribuições manutenção de poder, promoção de estabilidade, facilitação de orientação ou exploração, ocultação de relações sociais efetivas, fornecimento de motivações, canalização de comportamentos etc.

Por fim, a quinta e última pergunta: “Quando se evidenciam as relações atribuídas entre a base social e o conhecimento?“, à qual coloca teorias historicistas, limitadas a sociedades ou culturas específicas e teorias analíticas.

Em que sentido poderia o empreendedor, sendo estudante de administração, economia, áreas afins, avançar nessa dimensão da sociologia, de modo a comprender-lhe os paradigmas?

Pode-se refletir de várias formas a respeito desta questão. Talvez de modo a compreender que seu empreendimento, qualquer que seja o tipo de atuação, não poderá negligenciar um exame crítico de prisma sociológico. Por conseguinte, não escapa também a ele entender e fazer a análise estrutural dos problemas do momento em que vive, tal como postula Mannheim, em especial aqueles que se manifestarão nos ambientes externo e interno da organização em que atua, principalmente o primeiro, que tende sempre a ser menos controlável do que compreensível. Poderá conscientizar-se melhor como cientista, atuante teórico e prático, que entende que todas as tensões de seu momento histórico, todas as crises políticas e sociais do ambiente externo terão reflexos no meio imediato em que trabalha, de forma que será um agente solucionador dos problemas práticos que lhe aparecem simultaneamente, no momento em que levanta questões teóricas e orienta-se intelectualmente.

Todas as cinco questões colocadas no paradigma por Merton são, nesse sentido, de inestimável valia, posto que reconhece-se facilmente que as bases sociais e culturais como posição social, modo de produção, estruturas de grupo, estrutura de poder, valores, ethos etc., devem ser constante e criticamente examinadas pelo empreendedor.

Desnecessário dizer que os pontos de vista filosóficos-sistemáticos mencionados por Mannheim têm grande relevância em diversos âmbitos do conhecimento na atualidade, publica-se e debate-se abundantemente a respeito deles, e que a aproximação do empreendedor dessas correntes, conforme suas possibilidades, é indispensável para que possa compreender a gama de produtos culturais — ideias, possíveis ideologias, crenças éticas, a filosofia, tecnologia etc. — de sua própria área atuação que carrega em sua Missão, Visão e Vaores.

O que se faz agora com as crianças é o que elas farão depois com a sociedade.

— Karl Mannheim

Referências:

  1. MANNHEIM, Karl; MILLS, Charles Wright; MERTON, Robert K. Sociologia do conhecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1967. 143p.
  2. Diccionario de la lengua española: ethos. Real Academia Española. Acesso: abr/2018.
  3. MALTEZ, Jose Adelino. Repertório Português de Ciência Política. Edição electrônica, 2004. Acesso: abr/2018.
  4. Learner’s Dictionares: zeitgeist. Oxford. Acesso: abr/2018.

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